No quentinho da fria chuva

Chove, intensamente.

A Natureza expressa a sua mágoa com estrondosos ruidos no céu...

Contemplo os clarões que por entre as frinchas entram.

O Mundo revoluciona-se à minha volta, e eu defendo-me por entre os meus lençois.

Reflicto, revivo, projecto...

Seria tão mais fácil se pudesse estar assim, comigo, só comigo...

Ter-me só para mim..

Sem a obrigação de responder às constantes apelações de todo o Mundo.

Não ter de dever isto e aquilo a este e aquele.

Não ter de corresponder a obrigações.

Por vezes, um comportamento egoista facilita muito.

Poder relacionar-me com as pessoas só quando preciso, seria tão bom...

Evitar as repetidas e repetidas rotinas de despertar para relacionamentos a determinada hora da manhã...

Ter de corresponder a certos comportamentos só para não ferir ninguém...

Suportar constantes e constantes sufocos só porque, por breves minutos, tentei respirar.

Só poder ir respirando novamente quando dou essa resposta que incessantemente procuram...

Ver o meu espaço ser invadido hora após hora porque,

simplesmente,

quero ter espaço para mim

e não quero ter espaço para um outro alguém que não eu...

Ter de obedecer a desejos de um outro alguém,

quando os meus próprios desejos há muito estão delineados..

Ter de realizar desejos para mim que não são desejos meus..

Solidarizo-me com toda esta revolta da Natureza:

encerro-me na minha toca,

contemplando a chuva que perdura em mim.

Parar, mirar-me, viver-me.

Quero ser dona de mim.

Seria tão mais fácil se não fosse fácil magoar alguém....

E assim, oportunamente continuo, e completo, a poética e deliciosa vivência que o dia de hoje me proporcionou.